O medo faz parte da vida cotidiana e é protetor. Quando será que, no entanto, ele fica diferente e passa a ser disfuncional e fazer o indivíduo perder possibilidades maravilhosas de experiências de vida?
Revista Psique - por Bruno Lima Nogueira*
O medo é uma reação adaptativa normal e de grande valia para a humanidade. Todos nós sentimos medo. Alguns medos são comuns, como o medo de baratas, de lugares altos, de ficar distante de quem se ama, de andar sozinho à noite e ser assaltado. O medo é um antigo conhecido do ser humano e é até mesmo culturalmente registrado, aceito e passado adiante. Para Darwin, o medo pode ser adaptativo. Ele pode proteger quando em situações de risco, fazendo o indivíduo responder com mais energia e qualidade para a sobrevivência. O medo de baratas, por exemplo, culturalmente tão aceito que até fazemos piada dele, nos protegeu e protege de possíveis infecções transmitidas por esses insetos. O medo de lugares altos pode fazer que tenhamos mais precaução quando nos aproximamos do risco de uma queda fatal, procurando a cautela acima de tudo. O medo de andarmos sozinhos à noite sem proteção, idem.
O medo faz hoje parte do que entendemos como reações ao estresse. Ele se relaciona com reações apenas didaticamente divididas, segundo tratado de Oxford, em emocionais e orgânicas, de perfil mais ansioso. Segundo este tratado, o medo traz à tona reações orgânicas, como o aumento da atenção focal sobre o objeto ameaçador, taquicardia, sudorese, tremor, aumento da tensão muscular, boca seca, e emocionais, como apreensão e irritabilidade. São reações típicas do indivíduo diante de ameaças, de excitação autonômica relacionada ao preparo do corpo para situações de luta e fuga. Para a fisiologia, são reações de perfil mais adrenérgico, Contudo, essas condições podem ser mais ou menos adaptativas: podem mais ou menos levar o indivíduo a conseguir superar e escolher defesas de boa qualidade com relação ao objeto e seus objetivos de vida. São típicas destas condições de estresse as estratégias de enfrentamento conscientes e inconscientes.
Não conseguir matar uma barata, mas pedir ajuda para que alguém a afugente ou mate é uma forma interessante de lidar com o medo. Não ir a lugares muito altos quando se sente inseguro, sem precisar disso no dia a dia, como um profissional que limpa janelas pelo lado externo do prédio, pode não ser problema algum. Isso se torna apenas um problema quando atrapalha o indivíduo, quando interfere em sua funcionalidade: quando se percebe uma dificuldade de enfrentar o que tem pela frente ou mesmo o expõe a outras situações prejudiciais como agressividade ou isolamento extremo, como o fato de evitar sair de casa. Essas reações compreendem mudanças orgânicas em prol do aprendizado, ou seja, diante delas estamos mais inclinados a compreender um determinado comportamento ou forma de pensar, porém, isso pode, novamente, ser mais ou menos cabível para uma existência de qualidade do indivíduo.
Segundo Nemeroff, o corpo se modifica diante desses níveis de estresse. O aumento significativo de hormônios corticoides pode levar a mudanças no padrão de respostas psíquicas do indivíduo e levar até ao surgirnento de sintomas como os transtornos ansiosos, que vamos falar mais adiante, e os transtornos depressivos.
• Para saber mais
Medo Normal
- Protetor de uma sitiação entendida como agressiva.
- Em situações extremas, sujeito enfrenta o problema.
- Permite racionalizar sobre a dificuldade.
- é funcional protege,mas não impede que o indivíduo enfrente o problema e aproveite a vida.
Medo disfuncional e fobia
- Protetor de uma situação entendida como aversiva.
- Em situações extremas, sujeito não consegue enfrentar o problema gerando muita ansiedade.
- Dificulta a capacidade de racionaliizar sobre a dificuldade.
- É disfuncional, protege, porém impede que o indivíduo enfrente o problema e, assim, pode ter limitações na vida.
* É medico psiquiatra pela Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP. chefe de plantão de Psiquiatria do Hospital São Paulo e Responsavel Técnico do CAPS Cidade Ademar. Especializado em Psicoterapia Interpessoal. transtomos de Personalidade pela UNIFESP e em avaliação de serviços pela Universidade de Toronto - Canadá. Pesquisa na área de Psiquiatria e Cultura. Contato: [email protected]