Saiba como Enio Ohmave, cofundador da escola online de idiomas Englishtown, largou um bom emprego na Apple, fez um longo tempo de reflexão pessoal e retomou a carreira na área de educação.
Revista Você S/A - por Luiz de França
À primeira vista, Enio Ohmaye, de 56 anos, co-fundador do Englishtown, sistema de aprendizado online da instituição de idiomas e intercâmbio EF, parece um desses empreendedores cuja carreira foi uma espiral para o sucesso. Até foi, mas não como ele gostaria. Mestre em ciência da computação pela George Washington Universitye Ph.D em inteligência e educação artificial pela Northwestem University, ambas nos Estados Unidos, Enio foi cientista da Apple, na Califórnía, e morou no Japão pela companhia fundada por Steve Jobs. Fazia uma carreira de dar inveja, mas era infeliz. Teve uma crise aos 44 anos e resolveu parar de trabalhar por dois anos. Nesse período, leu 78 livros, viajou, fez workshops, meditou, estudou e, então, descobriu sua verdadeira vocação. Hoje, vive em Xangai, na China, onde aperfeiçoa a plataforma online, que hoje tem 500 000 pagantes. Em passagem pelo Brasil, falou com a VOCÊ S/A sobre sua mudança de carreira.
VOCÊ S/A - Quando comecou sua insatisfação com á carreira?
Enio Ohmaye - Eu estava na Apple fazia três anos e não queria mais ficar apenas em laboratório. Queria trabalhar com marketing, e o presidente da Apple do Japão acabou me convidando para ajudá-lo nessa tarefa. Aceitei. E foi uma experiência esquisita, porque as pessoas do Japão são acostumadas a trabalhar com colegas que frequentaram o mesmo colégio ou universidade, e eu era um desconhecido que tinha sido chamado pelo presidente. Financeiramente eu estava bem, mas me sentia um fracassado. Isso foi entre 1995 e 1997. Quem olhava de fora achava que eu tinha feito a vida, pois tinha tudo que uma carreira pode proporcionar. Só que eu me sentia mal. E aquilo me fez parar para pensar sobre o que era importante na minha vida.
VOCÊ S/A - Esse foi o momento da virada?
Enio Ohmaye - Foi o início. Antes, voltei para os Estados Unidos para participar de uma startup de MBA online com algumas grandes universidades, como Standford, Columbia e London Business School. Isso era o início da internet. E é engraçado porque eu estava bem, mas continuava me sentindo mal. Eu tinha dois carros, tinha uma casa grande em Chicago, tinha esposa, cachorro, título acadêmico, salário bom, tinha tudo e me sentia morto por dentro. Eu pensava: "Se isso é sucesso, minha jornada acabou". E vivia o dilema: faço o que é certo ou faço o que eu quero? É aquele contraste entre cabeça e coração. O raciocínio lhe diz "Você está bem, ganhando bem, está no caminho certo, já não é mais criança. Faça o que precisa fazer para garantir um futuro legal. Não está mais na hora de seguir sua paixão".
VOCÊ S/A - Quando percebeu que precisava mudar?
Enio Ohmaye - Foi uma crise de meia-idade. Eu tinha 44 anos. Eu parei por dois anos e falei: "Não vou fazer nada por dinheiro". Por coincidência, meu último dia nessa startup foi 11 de setembro de 2001.
VOCÊ S/A - E como você comecou a fazer o que queria?
Enio Ohmaye - Nesses dois anos sem fazer nada, pensei muito, li 78 livros, viajei, fiz workshops, meditei e estudei muito sobre desenvolvimento pessoal. Um dia fui visitar um amigo que tinha acabado de ter filho e, quando olhei aquele bebê, me senti como se tivesse nascendo de novo. Coincidentemente, no caminho de casa, Bill Fisher, o presidente da EF, que era meu amigo, me ligou pedindo ajuda para renovar a escola. Era uma das poucas pessoas para quem eu não podia dizer "não". Fizemos o projeto. Deu certo e nunca olhei para trás.
VOCÊ S/A - E o que você aprendeu com tudo isso?
Enio Ohmaye - Eu tenho uma história familiar de sucesso e fracasso. Saímos de São Paulo e fomos para Brasília viver uma vida encantada. Eu fiquei muito na casa de Oscar Niemeyer porque o neto dele era meu melhor amigo, o filho do presidente do Banco Central era o meu melhor amigo, Nelson Piquet brincava de autorama no porão da loja do meu pai. Até que a ditadura militar chegou e o negócio do meu pai faliu. Voltamos para São Paulo, mas meu pai não conseguiu mais se reerguer. E depois das minhas andanças eu parei para pensar no que aprendi nesses altos e baixos e concluí que estava vivendo como meu pai, querendo o que eu não tinha e não querendo o que tinha. Descobri que a gente é quem escolhe como vai processar nossas experiências. Somos uma máquina cognitiva com processador e memória. E tem programa que pode processar dados novos que estão entrando no sistema por meio dos nossos sentidos, tem programas que a gente usa para computar coisa que está na memória e tem um que é muito perigoso: aquele que usamos para comparar o momento que vivemos com o dos outros, pois acabamos cobrando demais da gente.
VOCÊ S/A - Você se considera realizado?
Enio Ohmaye - Totalmente. Eu voltei para aquilo que era minha paixão. Eu gosto desse uso de tecnologia para educação. Foi a melhor coisa que fiz na minha vida. E o que acho mais bacana é poder criar algo que ajuda as pessoas a abrir seus horizontes, pois o aprendizado de outro idioma, como o inglês, tem um impacto grande profissionalmente. N Na China, se você sabe inglês seu salário dobra. Aqui no Brasil é diferente, pois passou a ser uma necessidade saber inglês. Mas saber falar outra língua possibilita o acesso à informação e a integração com outras culturas viajando a turismo ou a negócios, expressando seus pensamentos nas redes sociais ou batalhando até uma expatriação, por exemplo.