Surge uma nova arma contra o envelhecimento do cérebro: os jogos de computador que estimulam as sinapses e retardam enfermidades como o mal de Alzheimer. Mas a eficiência ainda está longe da unamidade.
Revista Psiquê - por Roberto Lopes
Quais são os limites e a comprovação científica de eficácia dos tratamentos médicos aplicáveis - e autoaplicáveis - por meio da web?
O recente lançamento no Brasil do Cérebro Melhor (www.cerebromelhor.com.br), programa de exercícios na forma de jogos que prometem melhorar a capacidade de memória, atenção, linguagem, raciocínio lógico e visão espacial, traz à tona o debate sobre a validade de se lançar mão da informática - e da internet - como forma de se preservar a qualidade de vida.
O Cérebro Melhor oferece quatro planos de contratação dos exercícios (mensal, trimestral, semestral e anual) - a preços que variam entre R$ 13,00 e R$ 24,90 ao mês -, e conta com o apoio entusiasmado da respeitada neurocientista Suzana Herculano-Houzel (pesquisadora da Universidade Federal do Rio de Janeiro e consultora do programa Fantástico, da Rede Globo).
"A pergunta é: o que eu posso fazer para ter mais sinapses, isto é, mais trocas de informações entre os meus neurônios?", provoca a especialista, em entrevista à Psique Ciência & Vida. "Não estamos falando dos tais headphones especiais, que deixariam as pessoas mais inteligentes do dia para a noite, ou desses joguinhos de memória que existem de graça, aos montes, na internet. Os programas do Cérebro Melhor estabeleceram uma metodologia que serve à máxima na qual acredito: quanto mais você usa [o cérebro], melhor ele fica. Permitindo até que você trabalhe só as suas fraquezas".
A chamada Medicina Virtual - ou E-medicine, como preferem alguns - propõe, contudo, bem mais.
Nos Estados Unidos, uma terapia de exposição à realidade virtual simula situações que causam ansiedade em pacientes com fobia.
O tratamento é apresentado como prática que incorpora várias vantagens em relação à terapia tradicional. Os médicos não precisam sair de seus consultórios. Sua programação é mais fácil, e ele sairia mais barato em longo prazo. Além disso, geralmente os pacientes estão mais dispostos a participar de um programa que sabem que fará com que lidem com seus medos de uma maneira não física.
A E-medicine é, sobretudo, um estimulador da união de forças entre especialistas da Saúde Mental e mestres da Ciência da Computação.
Há cerca de 20 anos, o Dr. Larry Hodges, cientista da computação de realidade virtual da Universidade da Carolina do Norte (EUA), aliou a sua experiência às pesquisas da Dra. Barbara Rothbaum, professora de psiquiatria na Emory University. Juntos, eles trabalham em um projeto que testa a eficácia da tecnologia da realidade virtual na recriação de medos de pacientes. Seu projeto inicial: criar uma simulação para pessoas que sofrem de acrofobia medo de altura. O paciente é tratado por meio do uso de um binóculo especial, que roda um programa capaz de fornecer a ilusão de estar em grandes altitudes.
O conjunto de jogos do Cérebro Melhor é fruto da experiência da empresa Scientific Brain Trainning, de Lyon, França - que opera com exclusividade o programa Happyneuron (Neurônio Feliz) -, e de uma aliança semelhante à de Hodges e Rothbaum.
No caso da companhia francesa, o neurologista Bernard Croisile juntou seus esforços à criatividade do Mestre em Ciências da Computação Franck Tarpin-Bernard, que foi objetivo em suas declarações no lançamento do produto: "Trabalhamos três áreas fundamentais da Saúde Mental: a melhoria das funções cognitivas, a prevenção do declínio da capacidade cognitiva, e uma prática que desacelera a degradação da função cerebral, atrasando, dessa forma o mal de Alzheimer".
O problema, para a dupla Tarpin-Bernard/Croisile, é que ainda existe, no plano internacional, uma respeitável contestação à eficácia dos jogos de aperfeiçoamento das habilidades cognitivas.
No início deste ano de 2010, um estudo da equipe de Cognição e Ciências do Cérebro do Conselho Britânico de Pesquisa Médica realizado durante seis meses no Reino Unido, por solicitação do grupo de comunicação BBC de Londres, concluiu que jogos de computador online, projetados para aprimorar a memória e o raciocínio, tem efeito virtualmente nulo.
O relatório da pesquisa foi publicado no portal da conceituada revista Nature. O resultado da investigação britânica garante: jogos de computador criados para treinar e estimular o cérebro, não tornam as pessoas mais espertas e não promovem o desenvolvimento cognitivo mais do que um videogame comum.
A polêmica acende o debate sobre a comprovação da eficácia no tratamento virtual. Mas a verdade é que essa falta do consenso científico constitui apenas uma parte dos problemas dos fornecedores de programas de computador para a melhoria da função cerebral.
O sucesso comercial dos jogos depende também da capacidade dos fornecedores de manter a oferta dos jogos a preços a acessíveis. Segundo Tarpin-Bernard, a Scienrtific Brain Trainning, já conta com 20 mil clientes ao redor do planeta, resultado festejado mas que pode ser considerado ainda relativamente modesto - já que a ferramenta virtual está no mercado há cerca de 8 anos.
• Para especialista, jogos resgatam autoestima
Franck Tarpin-Bernard, o especialista que criou o Cérebro Melhor, concedeu entrevista exclusiva à Psique Ciência & Vida na ocasião do lançamento do produto. Leia alguns trechos da conversa.
Psique: Jogos por computador podem contribuir com os tratamentos de distúrbios mais complexos da Saúde Mental?
Tarpin-Bernard: Sem dúvida. A expectativa é que jogos por meio da web possam auxiliar de forma importante os portadores de esquizofrenia e depressão. E também reduzir o impacto negativo de tratamentos médicos de fortes efeitos colaterais, como a quimioterapia, que causa prejuízos à capacidade cognitiva das pessoas.
Psique: E qual é a aceitação que esta metodologia tem na classe médica?
Tarpin-Bernard: Isso varia. Na França, os médicos particulares parecem temer um pouco que sua clientela vá aderir aos nosso jogos. Mas a Saúde Pública francesa é muito forte e está bastatne propensa a acolher metodologias modernas que propiciam a redução de custos, especialmente no campo da Saúde Mental. Nos Estados Unidos, os médicos particulares também parecem muito favoráveis aos jpgos de computador, áté porque, lá, a Medicina Pública ainda é muito incipiente. Aqui no Brasil os hospitais particulares têm se mostrado muito interessados na nossa metodologia.
Psique: Mas o que seria importante, neste caso, seria a aceitação dos programas de computador por parte de psicólogos e psiquiatras...
Tarpin-Bernard: Exato. E acreditamos nisso. Nos casos em que os pacientes se mostram receptivos ao tratamento por meio da prática dos jogos de computador, há um notável resgate da auto-estima. E essa recuperação da confiança é importante para o tratamento dos distúrbios da mente.