Droga que ajusta relógio biológico é eficaz contra depressão, diz estudo. Remédio similar à melatonina, hormônio do sono, faz parte de nova classe de antidepressivos. Medicamento já é vendido no Brasil; especialistas dizem que nem todo paciente se adapta ao tratamento.
Jornal Folha de São Paulo - Juliana Vines
Um remédio que imita a ação do hormônio do sono é eficaz contra depressão, diz revisão de estudos publicada no periódico "Lancet". A substância testada foi a agomelatina, que, pode ser similar à melatonina - hormônio que atua à noite - ajuda a regular o relógio biológico.
Segundo os autores do estudo, pesquisadores das universidades de Sydney e Central Queensland, Austrália, existe uma relação direta entre depressão e desequilíbrio dos ritmos biológicos, marcados pelo horário e pela duração do sono e da vigília. Uma mudança no relógio biológico pode resultar em alterações metabólicas. Cerca de 80% das pessoas que têm depressão sofrem de alguma alteração no sono. O ínverso também vale: insones têm maior chance de ter transtornos de humor.
"Até Pouco tempo, pensava-se que os distúrbios do sono eram um sintoma da depressão. "Hoje, sabemos que eles podem levar ao desenvolvimento da doença", afirma a psiquiatra Gisele Minhoto, professora da PUC-PR.
• Antidepressivo
A melatonina sozinha, vendida em cápsulas no exterior e pela internet, não é um antidepressivo. A agomelatina, além ser similar o hormônio, age no neurotransmissor serotoninas como outros antidepressivos. De acordo com os pesquisadores que revisaram 105 trabalhos sobre o tema, a droga é tão eficaz quanto os antidepressivos tradicionais, com a vantagem de não ter os mesmos efeitos colaterais (não causa perda de libido ou irritações gastrointestinais).
A longo prazo, os pacientes têm a metade das recaídas em relação ao grupo-controle, dizem os autores do estudo, que declararam ser patrocinados pela Servier, fabricante do Valdoxan, droga à base de agomelatina. O remédio é vendido no Brasil por, em média, R$ 200.
"É urna nova classe de medicamentos, eficaz e com ação mais localizada. Por isso, tem menos efeitos colaterais", diz José Alberto DeI Porto, psiquiatra da Unifesp. Ele afirma que receita a droga para pacientes depressivos com alterações no sono e para os que não toleram os efeitos colaterais dos outros antidepressivos.
O neurologista John Araujo da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, diz que a droga pode causar tontura e boca seca. "E cedo para receitá-Ia em larga-escala. É preciso fazer mais estudos."