Médicos entram em conflito sobre o papel do sal no aumento da pressão arterial e apontam sua supervalorização como fator de risco.
Jornal Folha de São Paulo - por Juliana Vines
A relação entre o alto consumo de sal e o risco de pressão alta foi questionada por uma pesquisa publicada no "Joumal of the American Medical Association". Segundo os autores do estudo, da Universidade de Leuven, na Bélgica, quem come mais sal não tem mais risco de ter hipertensão ou doença cardiovascular. E mais: o baixo consumo de sódio foi associado a um maior risco para o coração. "Nossos achados refutam as estimativas que dizem que vidas são salvas e custos de saúde são reduzidos com um menor consumo de sal", dizem os autores, na conclusão.
A afirmação gerou reações entre especialistas e, no último sábado, o periódico "Lancet" publicou um editorial questionando o trabalho. "Esse estudo pouco contribui para a compreensão da doença", diz o texto.
A pesquisa belga mediu a quantidade de sódio na urina de 3.681 pessoas e acompanhou a incidência de doença cardiovascular nos voluntários por sete anos. Segundo o cardiologista Marcus Bolivar Malachias, da Sociedade Brasileira de Cardiologia, esse não é o primeiro estudo que mostra uma correlação fraca entre sal e hipertensão. "Já existem autores que afirmam que o sal não é o fator mais importante. Hoje, a obesidade talvez seja um fator mais grave do que o sal."
• Multifatorial
A hipertensão tem muitas causas: alterações no batimento cardíaco, na parede das artérias ou no funcionamento dos rins, por exemplo. O estilo de vida também está relacionado à doença. Má alimentação, sedentarismo, obesidade, fumo e estresse são alguns gatilhos. A ingfestão de sódio é mais um deles. A substância, que está no sal de cozinha e também nos alimentos industrializados, é fundamental para o equilíbrio de líquidos.
Segundo o nutrólogo Durval Ribas Filho, da Abran (Associação Brasileira de Nutrologia), cada pessoa e cada população têm uma sensibilidade diferente ao sódio. "Cerca de 50% das pessoas são mais sensíveis. Como não há como saber quais são, é melhor que todos reduzam o consumo."
Especialistas recomendam a ingestão máxima de 5 g de sal por dia ou 2 g de sódio. A restrição total também não é benéfica, de acordo com Luiz Aparecido Bortolotto, cardiologista do InCor. "Ingerir menos do que 2 g pode ativar processos inflamatórios e aumentar o risco cardiovascular. Há uma relação com a arteriosclerose."
Para o cardiologista Celso Amodeo, do HCor, a pesquisa belga é sensacionalista. "Existe uma briga muito grande em torno do sódio. Esse estudo fez poucas dosagens de sal, e os grupos de pacientes analisados eram homogêneos demais." O fato de as idades e as nacionalidades dos voluntários serem próximas impede que as conclusões sejam generalizadas, segundo Amodeo. "A pressão aumenta com a idade. Existe uma relação direta entre hipertensão e casos de derrame e infarto."
• Sódio e a pressão
Substância regula o equilíbrio dos líquidos no corpo.
- Hipertensão
É o aumento na pressão do sangue nas artérias, causado por diversos fatores como o maior bombeamento do sangue, alterações na espessura das artérias ou no volume de sangue na corrente sanguínea.
- Diagnóstico
O médico mede a pressão sistólica (mais alta) e a diastólica (mais baixa). Quando é maior do que 14/9 em três medições, em dias diferentes, considera-se que a pessoa tem hipertensão e está exposta a risco.
- Consequências
Sobrecarga do coração, rins e cérebro. Pode levar a derrame, aneurisma, insuficiência cardíaca, infarto e lesões renais.
• Controle da pressão
1 -A pressão é controlada pelo sistema nervoso, pelos rins e pelas paredes das artérias.
2 - O sistema nervoso libera hormônios que controlam os batimentos cardíacos e a contração das artérias.
3 - Os rins controlam o volume de água, sal e a liberação de outros hormônios responsáveis pela contração nas artérias.
4 - O sódio e o potássio fazem parte do equilíbrio entre os líquidos que ficam dentro e fora das células.
5 - Ingerindo sal de mais, o diâmetro dos vasos pode ficar menor, aumentando a pressão.
6 - Não se sabe como cada pessoa reage ao excesso de sódio.