Jornalista Joshua Foer conta em livro como se tornou ás da memorização. Campeão americano em 2006, autor explica suas técnicas em "A Arte e a Ciência de Memorizar Tudo"
Jornal Folha de São Paulo - por Roberto Kaz
No crachá lia-se "Joshua Foer, Atleta Mental". Era uma manhã de 2006 e Foer, então com 24 anos, disputava a final do Campeonato Americano de Memória. Se sagraria campeão após decorar a ordem de 52 cartas, 87 dígitos e 107 nomes.
Para um virtuose da mnemônica, seria feito notável. Para o novato Foer - um jornalista de cíêncía - beirava o milagroso. Até então, era um especialista em esquecer onde deixara o carro, por que abrira a geladeira e - pecado mortal - o aniversário da namorada. Irmão do autor Jonathan Safran Foer, Joshua publicou "A Arte e a Ciência de Memorizar Tudo" (Nova Fronteira).
Além de explicar típicas falhas de memória ("por que me lembro da música de Britney Spears, embora esqueça o nome do autor que admiro?"), o livro, recém-traduzido, conta como Foer se tornou um especialista em decorar informações absurdas. O autor remonta, primeiro, a 1928 para explicar o caso real de "S" (na literatura médica nomes de pacientes jamais são citados). Dotado de uma memória extraordinária, "S" costumava, também, atribuir cor, textura e sabor aos sons que ouvia. Assim, a voz de um psicólogo lhe era "fragilmente amarela"; a do cineasta Sergei Eisenstein se assemelhava a "uma chama".
"S" sofria de sinestesia, desordem neurológica em que sentidos como olfato e audição se entrelaçam. Para se tomar um especialista em memória, coube a Foer "forjar" uma sinestesia em si mesmo. A técnica consiste em juntar imagens contraditórias para formar, como escreve, uma "memória sem concorrência" .
Por exemplo: instigado a decorar uma lista que incluía os itens "queijo cottage", "meias" e "seis garrafas de vinho", Foer imaginou a top model Claudia Schiffer na piscina de cottage, as garrafas de vinho sentadas no sofá de sua casa, conversando entre si (isso mesmo), e as meias -daquelas velhas- penduradas no lustre do teto. Foi batata.
Por telefone, Foer contou que uma memória prodigiosa "tem mais a ver com a capacidade de inventar cenas do que de reter informações". "Se há uma característica comum entre os competidores, é a criatividade" , disse.
Finda a conquista, Foer nunca mais competiu. Sua memória voltou ao estágio inicial. "É um esporte; você precisa de treinamento", diz. Hoje, quando apura uma matéria (está escrevendo para a revista "New Yorker"), anota as informações em um bloquinho. E voltou a esquecer por que abriu a porta da geladeira.