Não podemos ignorar, no processo de aprendizado escolar, as tecnologias de informação e comunicação.
Jornal folha de São Paulo - por Silvio Meira
Trinta anos depois do primeiro PC, só 7% dos coordenadores pedagógicos das escolas brasileiras acreditam que seus professores sabem preparar uma apresentação em PowerPoint. Há 15 anos na era das redes, só 20% dos professores dizem estar na web, a partir da escola, quase todos os dias. Tal estado de coisas só não é mais preocupante porque 69% dos professores com menos de 30 anos revelam estar na rede a partir de casa, todo dia ou quase, realizando atividades associadas ao seu papel na escola.
Os dados são da pesquisa sobre as TICs (tecnologias da informação e comunicação) nas escolas, empresas e domicílios, publicada pelo CGI.br (Comitê Gestor da Internet brasileira). Você poderia dizer que o papel dos professores, na escola, é "dar aulas". Mas não, não é. O principal papel dos professores, em todos os níveis, é conduzir processos de criação de oportunidades de aprendizado. E isso pode ser feito de muitas formas, entre as quais a aula.
Mas a aula à qual estamos acostumados -normalmente a explanação de um texto conhecido, quando não a repetição pura e simples, na escola, do material que os alunos poderiam ter lido em casa para discutir em sala - já deveria ter sido proibida há décadas. Talvez "proibida" seja muito forte neste contexto. Mas você já imaginou a quantidade de tempo e de gente que se perde, mundo afora, ouvindo o professor recitar, e muitas vezes mal, um texto que poderia ser lido antes da aula, especialmente pelos maiores, para um debate em sala?
Será que o processo de aprendizado mudaria significativamente se todos os professores soubessem preparar e realizar uma apresentação em PowerPoint, talvez resultado de terem mais acesso à internet na escola? Não necessariamente, até por que o domínio da tecnologia para expressar o conteúdo não significa domínio do conteúdo.
E estamos cansados de saber que um dos maiores problemas dos professores dos primeiros níveis de ensino é sua formação, em cursos de pedagogia que, se têm pouco a ver com as necessidades reais das escolas, estão quase sempre abaixo da critica no que tange à qualidade de seu próprio processo educacional. Ainda por cima, de que adiantaria preparar uma apresentação computacional, gráfica e interativa, se apenas 4% das salas de aula têm um PC para apresentá-Ia?
Ocorre que as tecnologias de informação e comunicação não podem mais ser ignoradas no processo de aprendizado, até porque são parte da linguagem dos aprendizes. Internet, redes sociais, jogos digitais, smartphones não são uma raridade exótica- na realidade dos alunos. Mais de 85% das residências têm celular, 35% têm computador, 31% estão ligadas à internet. A sala de aula, coitada, está desconectada. Entre os 44% dos brasileiros que usam computadores com alguma frequência, 50% sabem usar uma planilha e manipular som e imagem e, surpreendentemente, 18% têm alguma competência em programação. Aí é que a escola, os professores e a sala de aula ficaram, em : termos de competências em TICs, muito atrás da média da população.
O que quer dizer, também e auspiciosamente, que as oportunidades de aprendizado pularam o muro da escola e foram para a rua, onde estão situadas, do ponto de vista das TICs, mais competências do que no sistema educacional. Isso é bom, porque indica que pessoas e empresas não estão dependendo só da escola e de sua dinâmica para aprender, o que realmente deveria ser o caso em uma sociedade "em rede", de informação e conhecimento.
Mas quer dizer também que a escola é quase irrelevante para o aprendizado de um vasto conjunto de fundamentos e de técnicas que são essenciais no trabalho e na vida de qualquer um, hoje e no futuro, qualquer futuro. O estudo do CGI.br aponta problemas antigos, crônicos e diagnosticados há anos, que já poderiam ter sido tratados de múltiplas formas, se o sistema educacional tivesse a prioridade que deveria ter em um pais que, se no passado era "do futuro", quer, no presente, estar "no futuro".